O passado não reconhece o seu lugar

“O passado não reconhece o seu lugar: está sempre presente…” (Mario Quintana)

Nostalgia, ressentimento, mágoa, arrependimento, remorso e culpa. Quase sempre, esses sentimentos estão presos a um tempo que já se foi; são resquícios do passado. E, com relação a ele, não há o que se fazer. O passado é imutável.

“O passado não reconhece o seu lugar: está sempre presente.”- Mario Quintana

Ciente disso, o que você pode mudar é a forma como lida com as lembranças desse passado e, principalmente, o que faz com o seu momento presente. Ficar preso ao que já foi é se permitir ser sugado para trás: uma escolha paralisante, com consequências geralmente dolorosas.

A psicoterapia, nestes casos, é uma aliada importante, que pode atuar em duas linhas de ação: a primeira, na aceitação de que aquilo que já aconteceu está fora do alcance das nossas ações e de que é preciso legitimar a dor vivida para deixar de ser escravizado por ela; a segunda, no trabalho da consciência da importância de estar “presente no presente”.

Nesse sentido, o caminho precisa ser percorrido, a decisão de reconhecer e enfrentar as feridas precisa ser tomada, para que as dores reprimidas possam finalmente ser resolvidas. A partir daí, mesmo sabendo que não se escapa do passado e das marcas, por ele, deixadas, é possível seguir adiante.

Dessa forma, o passado é um livro que não se pode alterar. Mas, certamente, pode-se aprender coisas importantes em suas páginas e, a partir desses aprendizados, tomar melhores decisões, lidar de forma mais madura com as emoções e fazer bom uso das experiências vividas.

Assim, ficar preso a um cenário hipotético, em pensamentos, como: “E se as coisas tivessem sido de tal forma?” ou “E se eu tivesse feito diferente?”, ou ainda “E se aquilo não tivesse me acontecido?”, coloca você em um lugar de paralisia, com a atenção voltada para um passado que não se pode mais mudar.

Em contrapartida, reconhecer e aceitar que as coisas não voltarão a ser como antes, coloca você em um lugar de ação. Este pode ser o primeiro movimento para deixar o passado passar, recomeçando uma nova jornada, com maior preparo e abertura para uma vida mais feliz e equilibrada, no tempo em que ela realmente acontece: o presente.

Para ilustrar, Segundo Francine Shapiro (2012), as memórias armazenadas fisiologicamente formam a base para nossas percepções do presente, ou seja, as conexões inconscientes do seu sistema de memórias continuam afetando suas reações no presente.

Sob esse viés, o CID 10(classificação de transtornos mentais e de comportamento), o Transtorno de Estresse Pós-Traumático (TEPT) é um distúrbio de ansiedade que surge em consequência de alguma experiência muito impactante na vida do indivíduo. Ele é caracterizado pela dificuldade em se recuperar completamente depois de ter vivenciado, ou testemunhado um evento traumático, ou muito assustador.

Convém mencionar que os eventos que podem dar origem ao estresse pós-traumático variam bastante: um grave acidente de carro; episódios de extrema violência, como assaltos e sequestros; um ciclo de ameaças; situações de exclusão social, ou até de humilhação; perdas; violência doméstica, abusos, desastres naturais, entre outros.

Quem passou por esses traumas pode, diante de alguns gatilhos, ser levado a acessar essas memórias traumáticas e a revivê-las no momento presente – mesmo que não necessariamente tenha a ver com o trauma sofrido no passado.

Quando essas lembranças são revividas, trazem à tona emoções bastante negativas. Entre as reações mais comuns, estão os pesadelos, as lembranças repentinas, o sentimento de impotência, o desejo de fuga de situações que lembram o trauma, reações exageradas, ansiedade, humor deprimido, entre outras. Em alguns casos, essas crises podem ser muito frequentes, causando um medo excessivo, e constante, durante as atividades rotineiras. Mesmo que não apresentem nenhum perigo aparente, tais situações podem ser “gatilhos” para reações de luta ou fuga.

Entretanto, sem ajuda psicológica, essa situação pode se agravar, levando a quadros de ansiedade severa, dificuldade para lembrar de muitas coisas, dificuldade para dormir, explosões de tristeza e raiva, bem como a mudanças na rotina para evitar alguns lugares, elevadores, ambientes, entre outros.

Nem todas as pessoas que passam por um trauma desenvolvem o TEPT. Mas, aquelas que o fazem, geralmente se beneficiam de um acompanhamento psicológico que as auxilie a conhecer e a superar os medos desenvolvidos durante o evento traumático.

A boa notícia é que há a possibilidade de retomar a vida e reorganizar-se internamente para lidar com as experiências negativas com a devida proporção, mantendo a dor no devido lugar – sem negá-la; porém, não permitindo que ela ocupe, no presente, um espaço que não deve mais ocupar.

É importante também dizer que a harmonia entre os diferentes tempos da vida é essencial. Quando vivemos sem esse equilíbrio, o passado pode atrapalhar o futuro, o presente pode ser comprometido pelo passado, os sentimentos atuais podem interferir na percepção do que ficou para trás e no que vamos fazer daqui para frente, e assim por diante. Em todas estas distorções, quem mais sofre é você.

Neste ínterim, o ideal é que mantenhamos conosco as boas memórias, mas sem fingir que, algo não tão bom, não aconteceu. Das experiências desagradáveis, ou dolorosas, devemos extrair os ensinamentos e aprendizados. Com isso, podemos inclusive trabalhar o perdão e a gratidão, trazendo para o tempo presente uma sensação de paz interior, por abandonar uma dor que, embora tenha acontecido, passou.

Nesse contexto, o passado pode ser visto como uma escola, um tempo de aquisição de experiências que, se olhado com o devido desprendimento, pode permitir o rompimento de algumas crenças limitantes, as quais atrapalham nosso presente.

Já em relação ao futuro, este pode ser almejado sem o véu turvo do medo e das expectativas negativas, as quais podem se alimentar de traumas vividos no passado ou no presente. E, caso isso não seja trabalhado internamente, pode atrapalhar não só as nossas decisões, como também os acontecimentos que ainda virão. Então, manter o foco nos pensamentos positivos é estar em dia com suas emoções e com as possibilidades que o futuro pode oferecer.

Ou seja, sentir os tempos em seus devidos lugares é essencial para a felicidade do ser humano, pois é importante encontrar um equilíbrio entre o passado, o presente e o futuro. Isso proporcionará que você possa viver da melhor maneira, atribuindo o devido valor aos fatos e às emoções, em seus respectivos tempos, para que se possa, especialmente, aproveitar o presente – o tempo em que você de fato está.

Por fim, acredito que, assim, poderemos viver a vida em abundância que Jesus nos prometeu em João 10:10: “O ladrão vem somente para roubar, matar e destruir; eu vim para que tenham vida e a tenham em abundância.” Isto é, viver sobre plenitude de vida.

Portanto, se você sente que esta divisão não está clara internamente, procure a psicoterapia. Não perca a oportunidade de aproveitar mais o momento atual, afastando a ansiedade de querer saber e controlar exatamente como será o futuro, como também evitando manter-se preso a histórias do passado, que a ele pertencem. Por isso, viva o agora!

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INDICAÇÃO DE LEITURA:

 

REFERÊNCIAS:

https://psicoposts.com.br/

https://www.gotquestions.org/Portugues/vida-abundante.html

*Texto revisado pela professora Vanessa Monzillo  @prof.vanessa.redacao

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Rubiane
Rubiane
19/12/2022 5:36 PM

Gratidão 😊🙏 passando por problemas do passado que eu nem sabia que existia…. Minha memória apagou e eu não sei resolvê-los.